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quarta-feira, 25 de maio de 2016

Receita irá monitorar imóveis em tempo real

Com sistema de registro imobiliário nacional, fisco terá mais facilidade para encontrar bens de contribuintes que devem imposto, bem como para monitorar imóveis oferecidos como garantia
São Paulo - Um sistema nacional unificado de registro imobiliário vai permitir que a Receita Federal encontre e monitore de forma mais eficiente os bens de contribuintes que são alvo de processos judiciais de cobrança por parte do fisco.
O Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter), que foi criado por meio do decreto 8.764 no começo do mês, estava sendo concebido desde 2009 e pode começar a operar em breve, conta a advogada Mariana Loureiro, do escritório Bicalho e Mollica Advogados.
"O sistema permitirá que a Receita crie obstáculos para a transmissão de propriedade ou registro de garantia se ela sabe que aquele devedor está no limite", aponta a especialista. Até então, ela conta que alguns procedimentos de cobrança fiscal poderiam demorar meses para ocorrer.
Se antes, em alguns casos o fisco recebia informações somente no momento da transmissão do imóvel, agora as autoridades serão informadas em mais etapas do registro imobiliário, como por exemplo na ocasião de outorga de procuração pública, diz Mariana.
No decreto, consta que os serviços de registro público disponibilizarão à administração pública federal, sem ônus, documentos digitais atualizados "a cada ato registral". Em nota, a Receita Federal apontou inclusive que "será possível saber tempestivamente se o proprietário iniciar qualquer procedimento para desfazer-se de bens" dados em garantia pelas dívidas de imposto.
Em comissão no Senado Federal, em 2015, o subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita Federal, Carlos Roberto Occaso, contou que apenas a União possui 20 bancos de dados diferentes para procurar por imóveis rurais. Como os sistemas não conversavam entre si, os procedimentos fiscais eram muito dificultados.
Segundo o sócio do Demarest, Douglas Mota, mesmo quando uma pessoa física não incluída um imóvel na declaração de imposto de renda o fisco tinha dificuldades para apurar a omissão. Por isso, ele entende que o novo sistema vai ajudar não apenas na busca por bens de devedores, mas também nos procedimentos corriqueiros de fiscalização.
Penhora on-line
Outro ponto de destaque é que o decreto garante acesso ao Sinter por meio de interface própria tanto para o Judiciário quanto para o Ministério Público. Hoje, Mota aponta que o juiz precisa enviar um ofício para o cartório de registro de imóveis para obter as informações desejadas. "Agora haverá acesso direto, não será mais necessário fica oficiando", diz.
Ele entende, contudo, que pelo menos num primeiro momento não parece que o juiz poderá ordenar a inclusão de uma penhora na matrícula do imóvel por meio do Sinter. A dúvida surge porque hoje a penhora de dinheiro em conta corrente já é possível pelo sistema BacenJud - que conecta a Justiça ao Banco Central.
"Hoje [as autoridades] dependem muito mais de burocracia para ter acesso aos dados do que de qualquer outro fator", acrescenta o advogado. Mesmo que a penhora não seja feita via Sinter, Mota aponta que de qualquer forma é possível antecipar que a maior facilidade de encontrar os imóveis deve acelerar as sanções.
Mariana vai mais longe: ela entende que as medidas punitivas podem ficar mais rápidas e mais frequentes. "A Receita tem algumas ferramentas que ela acaba não usando tanto na prática porque as informações estão desencontradas", diz ela.
Um desses mecanismos é o arrolamento, menos rigoroso do que a penhora, mas já suficiente para comprometer o acesso ao crédito da empresa. Mariana explica que a medida pode ser usada sempre que o contribuinte deve mais do que R$ 2 milhões e que essa dívida corresponde a mais do que 30% do patrimônio. "Se pensarmos nessa proporção, deveria haver muito mais gente com bens arrolados. [Com o Sinter] isso vai ser conseguido de forma bem mais fácil."
Para evitar esse tipo de sanção, ela recomenda que as empresas sejam mais diligentes com as declarações fiscais e os registros de imóveis. "Nossa recomendação é que todo mundo reveja seus ativos e passivos. Se a empresa não for diligente e por erro ou descuido deixar de apresentar o imóvel, pode ser penalizada."

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Desvinculação do Habite-se do alvará traz vantagens para comércio e revitalização urbana

O alvará de funcionamento dos estabelecimentos do comércio e de serviços da Capital não precisará mais estar vinculado à regularização completa da edificação, o chamado Habite-se. A mudança, que foi implementada por meio da nova Lei de Zoneamento, trará vantagens aos comerciantes e representa um benefício para a revitalização urbana. 
Com a nova regra, entraves que prejudicavam a atividade comercial deixaram de existir, como as frequentes situações em que as edificações não tinham sua completa regularização por questões que estão fora do alcance daquele que exerce sua atividade nos locais. 
Exemplos disso são dívidas com o Imposto Sobre Serviços (ISS) da obra ou reformas em um único apartamento, que tornavam o prédio inteiro irregular.
Segundo a assessoria do Conselho de Desenvolvimento Local, da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a vantagem é que o comerciante não precisará depender do Habite-se de todo o prédio para ter seu imóvel regularizado. Isso permite mais flexibilidade e agilidade em ter sua documentação de funcionamento em dia.  
De acordo com Moira de Castro Vasconcellos, membro do referido Conselho, os empresários com estabelecimentos comerciais em bairros das regiões periféricas da cidade eram os que mais enfrentavam problemas com esse tipo de ocorrência, pelo fato da maioria dos imóveis possuir alguma irregularidade, por falta de loteamento oficial. 
Liberdade ao comerciante 
Para Duarte, a desvinculação dá liberdade ao empreendedor. “Esse mecanismo torna o empreendedor mais “dono” do seu espaço, com liberdade sobre o local em que o estabelecimento funciona e mais segurança em poder ter seu imóvel regularizado sem ter que esperar que todo o empreendimento esteja em dia.” 
Vale lembrar que a medida não significa a desobrigação da obtenção de alvarás para funcionamento, mas sua separação administrativa de processos que podem se estender por mais tempo, por questões de complexidade de cada caso, interferindo negativamente em oportunidades para o comércio. 
Os professores de Arquitetura e Urbanismo, Adilson Macedo e Gastão Sales, da Universidade São Judas Tadeu (USJT), acreditam que a desvinculação permitirá maior agilidade no processo de obtenção e de renovação de alvarás para pequenos comerciantes. 
Vitalidade Urbana 
De acordo com os professores, do ponto de vista urbanístico, a mudança também contribui para a promoção de maior vitalidade urbana. “Desvincular o Habite-se do alvará traz a vantagem do plano da cidade se tornar mais flexível para uma resposta positiva às transformações urbanas”, diz Macedo. 
Sales argumenta que outro benefício da alteração nas regras é o de minimizar os efeitos negativos das chamadas “ilhas monofuncionais”, que são locais que dão margem à insegurança, por estarem subutilizados, sem investimentos públicos nem movimentação. “A desvinculação irá estimular o aparecimento, de forma espontânea, de novos lugares de convivência nos bairros.” 
A cidade e as características mistas 
De acordo com os urbanistas, a cidade do século XXI é eminentemente mista e, nesse sentido, a redução das distâncias entre emprego e moradia se torna fundamental para diminuir efeitos negativos causados pelos longos movimentos pendulares (casa-trabalho-casa). 
“Mas o maior ganho da cidade mista é o melhor aproveitamento da infraestrutura urbana durante um maior número de horas por dia. Lembrando que, em áreas de pleno uso misto os picos dos vários usos se alternam, as lojas ficam mais tempo abertas, as pessoas se deslocam com segurança mesmo tarde da noite”, afirma Macedo. 
Sales acrescenta que também se observa uma alteração nos deslocamentos de carro, que tendem a ser reduzidos tanto em duração quanto em distância ou mesmo substituídos por outros menos poluentes, como caminhar ou usar bicicleta.

Fonte: Deisy de Assis 

terça-feira, 17 de maio de 2016

O que esperar do novo Ministério das Cidades?

Por Raquel Rolnik: Urbanista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.

Confirmada na semana passada a admissibilidade do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, no mesmo dia foram empossados os ministros do governo interino de Michel Temer. Para comandar a política urbana do país foi escolhido o deputado Bruno Araújo (PSDB), que assumiu o Ministério das Cidades. Independente da discussão sobre a legitimidade desse governo, debate que está longe de ter esgotado, o que esperar, afinal, desse novo ministro?

Com base na trajetória do deputado, que ganhou notoriedade ao dar o último voto necessário à aprovação da admissibilidade do impeachment na Câmara dos Deputados, e nas suas primeiras declarações após ter sido nomeado ministro, cabe perguntar: esperamos mudanças, mais do mesmo ou aprofundamento daquilo que a sociedade tem rejeitado e, em tese, que se constituiu em motivação popular para o pedido de impeachment da presidenta?

Em suas primeiras declarações, Araújo afirmou que vai apostar nas parcerias público-privadas (PPPs) para alavancar programas como o Minha Casa, Minha Vida (MCMV). Para ele, “é preciso libertar as amarras ideológicas e a burocracia que dificultam a execução das obras”. Disse ainda que o país precisa superar “uma relação tão preconceituosa que havia por parte do governo anterior entre o capital e a possibilidade de participar de programas sociais importantes”.

Ora, a fala do novo ministro parece demonstrar, em primeiro lugar, um profundo desconhecimento do Minha Casa, Minha Vida, já que este é inteiramente baseado na relação com a iniciativa privada. Nesse programa, são as construtoras – portanto, empresas privadas – que definem onde, como e o que construir. O papel do governo se limita a regulamentar as condições mínimas que devem ter os produtos que essas empresas colocam à venda e viabilizar a compra das unidades habitacionais produzidas através de subsídios públicos para os compradores. Não há neste caso, portanto, nenhuma “burocracia” nem “amarra ideológica” que dificulte a ação do programa, nem muito menos uma relação “preconceituosa com o capital”, já que o setor da indústria da construção civil foi o grande protagonista na montagem e execução do MCMV.

Assim, podemos inferir que o novo ministro, ao propor uma “aposta nas PPPs” na área de desenvolvimento urbano, está se referindo a alguns exemplos de PPPs estruturadas, sobretudo, em torno da preparação das cidades para a Copa do Mundo e as Olimpíadas, e que contam – sempre – com a participação ativa das grandes empreiteiras, justamente aquelas que têm sido objeto de investigação no processo da Operação Lava Jato, e outras com menos visibilidade na mídia.

Um exemplo “de sucesso” seria a PPP Porto Maravilha, na área central do Rio de Janeiro. Essa é uma PPP na qual um consórcio, formado por três empreiteiras (Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia), implanta todas as transformações urbanas e faz a gestão do território por 15 anos. 100% dos recursos para financiar a operação (incluindo as obras e a remuneração do trabalho do consórcio) vêm dos cofres públicos, através de um aporte de mais de R$ 4 bilhões do nosso FGTS.

Como nesta PPP o custo total da operação ultrapassa os R$ 8 bilhões, os outros R$ 4 bilhões serão arrecadados através da especulação imobiliária com terrenos públicos. Isso porque, além do aporte de bilhões de reais do FGTS, foram disponibilizados terrenos públicos (70% da área, antiga zona portuária do Rio de janeiro, era pública) para serem explorados pelo consórcio, em sociedade com incorporadoras e fundos de investimento, através do lançamento de produtos imobiliários como torres corporativas e hotéis, ou seja, apenas com usos que têm alta taxa de retorno financeiro, e não com os usos de que a cidade do Rio mais precisa neste momento.

Em resumo, numa operação como esta, o que temos de “privado” é basicamente o lucro das incorporadoras, fundos de investimento e empreiteiras do consórcio, já que os custos são totalmente públicos. Não há grande diferença entre essa modalidade e as contratações de empreiteiras para grandes obras e serviços públicos, notadamente a grande fonte de relações incestuosas entre o Estado e o setor privado, com grande relação, como temos visto, no nosso modelo político-eleitoral.

No caso da PPP do Porto Maravilha, aliás, já foi amplamente noticiada  a denúncia de que empresas do consórcio pagaram propina ao ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), que teria intermediado a entrada dos recursos do FGTS na operação. Essas empresas estão sendo investigadas pela operação Lava Jato. A imprensa também já noticiou as relações do novo ministro com a Odebrecht, uma das participantes do consórcio, que teria financiado sua campanha em 2010 e campanhas de candidatos a prefeito ligados a ele em 2012, não se sabe ainda se legal ou ilegalmente. Sempre é bom lembrar que o pagamento pelo favor das doações para as campanhas se dá através da contratação preferencial dessas empresas para grandes obras públicas.

Ora, as PPPS, apregoadas pelo novo ministro como “solução” para os problemas de desenvolvimento urbano, nada mais são do que um aprofundamento justamente da relação promíscua entre o privado e o Estado, cuja essência é a privatização de fundos e recursos públicos, articulada à viabilização da permanência no poder de grupos políticos. Esta é a forma como os personagens diretamente envolvidos nessas iniciativas têm se comportado até o momento. E continuam, infelizmente, sendo estes os personagens da tão falada “mudança”.