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terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Locação: Posso ser meu próprio fiador?

Em tempos de aperto financeiro, a locação é interessante, seja para fins comerciais ou residenciais. Porém, muitos futuros inquilinos, se complicam quando a imobiliária ou o proprietário do imóvel pedem como garantia, um fiador.

A legislação permite a exigência em contrato de locação de garantias como: caução, fiança, seguro fiança, ou cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (Art. 37, Lei de Locações).

Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:

I - caução;
II - fiança;
III - seguro de fiança locatícia.
IV - cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.

Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação.

Fora isso, o proprietário apenas pode exigir 1 (um) tipo de garantia, sob pena de nulidade do contrato de locação. Por assim ser, é frequente que se peça a garantia via fiador, por ser a forma mais simples. E é justamente neste ponto que ocorrem os problemas.

O futuro inquilino de um imóvel comercial, por exemplo, não quer perder a locação apenas pelo fato de não ter um fiador, então opta por formalizar o contrato pela sua empresa individual, e prestar fiança pelo seu CPF, como pessoa física, sob seus bens pessoais.

É aí que reside o embate, tanto para o locatário como locador. Antes de tudo, seguimos com o conceito apresentado pelo Código Civil:

Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.

Da análise do dispositivo legal, já se pode perceber que o intuito da legislação foi de trazer 3 (três) pessoas na relação: o devedor (aquele que deve), o credor (aquele que tem algo para receber) e o fiador (aquele que garante a dívida caso o devedor não pague).

Entretanto, quando o devedor assume também a figura do fiador, a relação fica desequilibrada, e eventualmente, permeada por nulidades. Até porque, nos termos do art. 39 da Lei de Locações, a obrigação do fiador se estende até a devolução efetiva do imóvel, mesmo quando prorrogada a locação por tempo indeterminado.

Art. 39. Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta Lei.

Vejamos um julgado do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema:

DIREITO CIVIL. LOCAÇÃO COMERCIAL. FIANÇA RECÍPROCA. MAIS DE UM LOCATÁRIO. VALIDADE DA GARANTIA. 1. “A fiança é um contrato acessório que pressupõe, para sua existência, três pessoas: o credor, o devedor afiançado e o fiador (AgRg no Ag 1.158.649/RJ, 5.ª Turma, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe de 29/03/2010). [...]

E, na linha do mencionado comando normativo, este Superior Tribunal de Justiça firmou o posicionamento de que a fiança de si mesmo não é um contrato juridicamente possível, pois esta espécie de avença pressupõe a existência de três partes, pois sua lógica é a garantia de um terceiro. 2. Havendo mais de um locatário, é válida a fiança prestada por um deles em relação aos demais” (idem). Nesse caso, tem-se uma fiança recíproca, o que afasta a invalidade do contrato. [...]

Recurso Especial nº 911.993 - DF (2006/0279066-1) / Relatora: Ministra Laurita Vaz

No caso, a ministra Laurita Vaz entendeu pela legalidade da fiança prestada por um inquilino em relação aos demais, pelo fato de haver mais de um locatário – a chamada “fiança recíproca”. Se diversamente fosse, seria um contrato juridicamente impossível, visto que toda a lógica da fiança, é ter a garantia de uma terceira parte que não está diretamente envolvida no negócio.

Assim, podemos observar reflexos nas relações empresariais, singularmente, no empresário individual (EIRELI), na forma da Lei 12.441/2011, que assume sob sua firma individual, fiança em contrato de locação. O TJ-SC já analisou a questão:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. ENCARGOS LOCATÍCIOS. LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NULIDADE DA FIANÇA PRESTADA POR EMPRESÁRIO INDIVIDUAL. ARTIGO 818 DO CÓDIGO CIVIL. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. O empresário individual, ou titular de firma individual, não pode prestar fiança para a empresa por ele mantida, visto a impossibilidade de se transformar uma firma individual em pessoa jurídica.
(TJ-SC – AI: 566227 SC 2008.056622-7, Relator: Fernando Carioni, Data de Julgamento: 23/05/2011, Terceira Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Agravo de Instrumento, de Joinville)

Isto é, o empreendedor individual não pode ser fiador de si mesmo, pois seu patrimônio pessoal está diretamente ligado ao da empresa, mesmo que esta possua um CNPJ e capital social integralizado.
Diferentemente ocorre nas outras modalidades empresariais, aquelas compostas por 2 sócios. Nestes casos, é possível em contratos de locação, que a empresa seja a locatária, e apresente como fiador um dos sócios, na qualidade de pessoa física, respondendo com seus bens pessoais.


Em suma, não se recomenda que o proprietário do imóvel/imobiliária aceitem fiança prestada por empresário individual, quando este for o inquilino. Ou ainda, quando requerida a locação por pessoa física, que apresente a si mesmo como fiador, justamente pelas futuras nulidades que poderão advir quando o credor se puser a cobrar judicialmente os débitos do imóvel.

Fonte: Suzanna Borges de Macedo Zubko, Advogada.

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